Saint John, 1 de outubro, 2025 (IICA). A história de Novella Payne é a de uma mulher que soube se reinventar, voltar às suas raízes e construir, com visão e trabalho, um empreendimento que hoje é símbolo do valor da vida rural em Antígua e Barbuda. Fundadora da empresa Granma Aki, Payne se define como “agroprocessadora”, um termo que resume sua capacidade de transformar a riqueza agrícola do seu país em produtos com valor agregado que chegam a supermercados, hotéis e lares dentro e fora do Caribe.
Pelo seu trabalho como produtora, geradora de valor agregado e difusora da cultura gastronômica do seu país, Payne é destacada como uma das Líderes da Ruralidade das Américas pelo Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura (IICA). Novella receberá o prêmio Alma da Ruralidade, criado pelo IICA para destacar o trabalho dos que deixam a sua marca em prol da sustentabilidade na região e no planeta e da segurança alimentar e nutricional.
Nascida em Antígua, Payne passou grande parte da sua infância e juventude na Inglaterra, onde tinham emigrado seus pais. Lá recebeu sua formação formal e criou os seus filhos, mas sempre teve certeza de que algum dia voltaria ao país onde nasceu. Essa volta ocorreu em 1987, quando seus filhos já eram adultos e podia começar uma nova etapa em sua vida. Antes de se dedicar à agroindústria, abriu um salão de beleza na zona do histórico Nelson’s Dockyard, em Antígua, que dirigiu durante sete anos.
Porém, logo sentiu que esse caminho não coincidia com seus valores. “Um dia eu fiquei na porta do meu salão e disse: acho que Deus não quer que eu continue transformando o natural em artificial”, lembra. Foi então que fechou as portas e decidiu olhar para o campo.
A inspiração sempre esteve aí, nas lembranças da infância: os passeios pelo bosque, os aprendizados da sua avó sobre ervas e chás medicinais, o amor pelas plantas e pelas frutas. Com essa base, Payne começou a trabalhar na sua fazenda com citronela e graviola (conhecida no caribe como soursop), e pouco a pouco incorporou mangas, tamarindo, carambola, groselha (também conhecidas como pitanga ou ñangapiri) e outras frutas locais. Dessas matérias primas nasceram seus chás, molhos, geleias e doces. Com o tempo, também desenvolveu técnicas de secagem e conservação que lhe permitiram diversificar sua oferta. Hoje, os produtos Granma Aki se encontram nos principais supermercados e hotéis de Antígua e Barbuda, e inclusive são solicitados por clientes dos Estados Unidos e do Canadá, conta orgulhosa.
Um dos momentos que mais a marcaram foi sua primeira venda em um supermercado local. Com apenas duas variedades de chá, citronela e graviola, e uma das etiquetas muito básicas, conseguiu que uma das principais cadeias lhe compara 18 dólares em produtos. “Eu me emocionei muito quando vi que esse supermercado acreditou na minha visão”, lembra. Com o tempo, esses pedidos iniciais cresceram até chegar aos 500 dólares, um número modesto, porém significativo para o começo da sua empresa. Hoje, as principais cadeias da ilha e vários hotéis incluem seus produtos em suas gôndolas e cardápios, assegura a produtora antiguana.
Payne não só processa e comercializa produtos agrícolas, mas também reivindica a cozinha tradicional do seu país.
Sim, é possível
O seu caminho não foi fácil. Payne admite que ser mulher empreendedora no seu país implicou grandes desafios. “Não é fácil. É preciso ter fortaleza e confiança em você mesma”, assegura. Por isso, desde o começo, procurou também transmitir a outras mulheres rurais que é possível gerar renda a partir da terra. Primeiro em pequenos recipientes, logo em jardins maiores, depois chegar a uma produção com fins comerciais. “Eu fico triste quando vejo mulheres que acreditam que não podem. Eu as tento mostrar que sim é possível”, enfatiza.
Nesse caminho, o acompanhamento do IICA foi essencial. Especialistas da instituição a apoiaram em diferentes momentos: com análises dos solos para sua fazenda, com assessoramento técnico para a secagem das frutas, com contatos para o design e a construção do seu secador e inclusive com a oportunidade de participar em workshops e estágios em outras ilhas do Caribe. “Eles me falaram que eu era capaz, me mostraram como e me conectaram com as pessoas certas. Esse apoio me permitiu crescer”, enfatiza.
Essa vocação de liderança a levou a presidir durante seis anos a Associação de Mulheres Produtoras Rurais de Antígua e Barbuda, muito mais do que o tempo previsto inicialmente, porque ninguém queria assumir a responsabilidade, comenta. Lá foi conhecida como mulher bulldozer, capaz de abrir portas e conseguir apoio para o seu grupo. Um dos momentos mais significativos da sua trajetória internacional como parte do grupo foi sua participação no encontro Fiyi, onde surpreendeu o público com um discurso simples e direto que refletia sua vida no campo e seu compromisso com a produção rural. “Não me lembro tudo o que eu falei, mas depois muitas pessoas se aproximaram para me dizer que tinha sido a melhor apresentação do evento”, conta com graça e satisfação.
Ingrediente: amor
No seu trabalho como agroprocessadora, Payne repete um lema que resume sua filosofia: “tudo natural”. Rejeita os conservantes artificiais e assegura que o seu verdadeiro ingrediente secreto é o amor. “Quando me perguntam que conservante eu uso, eu respondo: amor, L-O-V-E. Esse é o meu conservante”, diz com humor. Os seus rótulos normalmente incluem essa palavra, convencida de que a dedicação e o cuidado na produção também são transmitidos às pessoas que consumem seus chás e molhos.
A identidade cultural de Antígua e Barbuda é outro dos eixos do seu trabalho. Payne não só processa e comercializa produtos agrícolas, mas também reivindica a cozinha tradicional do seu país. Um exemplo é o ducana, um prato preparado com batata doce ralada, coco e especiarias, que é cozinhado em folhas de banana-da-terra. Payne defende a receita original, servida com peixe salgado e vegetais, ante uma versão moderna que incorpora passas de uva e que, segundo ela, transforma a preparação em uma sobremesa. A discussão sobre esse tema transcendeu as fronteiras da ilha e chegou aos meios internacionais como a BBC, que reportou a “polêmica do ducana com passas” como reflexo da importância da tradição culinária caribenha.
Outro prato central da gastronomia local é o fungi, uma preparação de milho muito parecida à polenta europeia, que em Antígua é servida em forma de bolas acompanhadas de peixe ou carne com vegetais. Novella descreve o prato com entusiasmo, bem como as sopas de vegetais que combinam batata doce, abóbora, eddo (um legume conhecido como inhame e chamado eddoe, em inglês) e outros ingredientes, as vezes com carne ou frango, porém ela prefira cozinhar somente com verduras e bastante tempero. “Se você passa pela minha casa quando estou fazendo sopa, certamente vai querer entrar e provar”, comenta com um sorriso.
Além da sua empresa e seu papel como referente em associações rurais, Payne também é uma promotora do agroturismo em Antígua. Porém reconheça que o setor avança lentamente, confia em que a riqueza natural do país insular pode se converter em um atraente para visitantes que procuram experiências autênticas ligadas ao campo e à gastronomia local.
Hoje, aos seus netos e netas, que também fazem parte do negócio, Payne transmite a paixão pela terra e o orgulho das tradições rurais. “No meu jardim tenho de tudo: plantas medicinais, frutais, de decoração. É um espaço aberto para quem queira aproveitar. Eu chamo de jardinagem ao azar: um pouco de tudo”, explica.
Consciente dos obstáculos, porém convencida de que o futuro está em produzir mais e melhor desde o campo, Novella se mantêm firme no seu objetivo: fortalecer o mercado interno, alcançar os mercados regionais e, finalmente, chegar ao plano internacional. “Para mim, o céu é o limite”, assegura. Sua história é, definitivamente, a de uma mulher que voltou às suas raízes para mostrar que a vida rural não é só possível, mas também fonte de inovação, orgulho cultural e desenvolvimento comunitário.
Payne procura transmitir às outras mulheres rurais que é possível gerar renda a partir da terra, até chegar a uma produção com fins comerciais.
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