Os membros do Conselho Consultivo para a Segurança Alimentar nas Américas, os Embaixadores da Boa Vontade e o Diretor-Geral do IICA dialogaram sobre o futuro do agro e a ruralidade. Eles também compartilharam e ouviram perspectivas sobre a crise sanitária global.
San José, 10 de dezembro de 2020 (IICA). O extraordinário desenvolvimento tecnológico da agricultura tem permitido aumentar significativamente os rendimentos da produção nos últimos anos, em harmonia com o meio ambiente. Graças a isso, hoje existem possibilidades de alimentar toda a humanidade. No entanto, os alimentos ainda não chegam às populações mais vulneráveis em quantidades suficientes e quem vive e produz nas zonas rurais não atinge, em muitos casos, uma vida de bem-estar.
Assim, os grandes desafios atuais da agricultura mundial – e que em tempos de pandemia se tornaram mais urgentes – consistem em como levar alimentos em volumes adequados a todas as pessoas que deles necessitam e como garantir que aqueles que os produzem tenham acesso a uma vida próspera no campo.
Este foi o principal tema de debate na 12ª Reunião do Conselho Consultivo para a Segurança Alimentar das Américas do Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura (IICA), realizada virtualmente, da qual também participaram os Embaixadores da Boa Vontade do Instituto.
O Conselho Consultivo foi constituído pelo IICA como um espaço de reflexão e geração de ideias ante a cenários futuros, a partir de duas questões fundamentais: para onde vai a agricultura no mundo e nas Américas e quais são as implicações dessas novas tendências na agenda de cooperação técnica do Instituto, buscando também promover análises e conhecimentos aos Estados membros em um contexto de grande incerteza.
O Conselho é formado por personalidades de dez países com um histórico de grandes contribuições ao setor agroalimentar, tanto na esfera política quanto acadêmica.
Os Embaixadores da Boa Vontade do IICA, por sua vez, compartilham preocupações e compromissos para alcançar o desenvolvimento sustentável e equitativo, unindo-se a causas que buscam aumentar a consciência pública enquanto trabalham pelo desenvolvimento por meio de projetos relacionados à segurança alimentar, à bioeconomia, às relações de gênero e juventude e à produção responsável, todos temas centrais da agenda do Instituto.
O psiquiatra e empresário argentino Hugo Sigman – precisamente um dos Embaixadores da Boa Vontade do IICA – foi o expositor convidado da reunião e fez referência não apenas ao impacto da pandemia na segurança alimentar, mas também à crise sanitária e suas consequências.
Sigman elogiou os avanços da atividade agrícola, que, a partir de inovações como o aprimoramento das sementes e a introdução da semeadura direta, aumentou significativamente seus rendimentos, com respeito aos processos da natureza que antes não existia.
“Esses avanços precisam ser consolidados e estendidos à atividade pecuária, que ainda não tem a mesma eficiência da agricultura”, destacou Sigman. O empresário acrescentou que “é uma ignomínia que ainda existam pessoas famintas ou desnutridas, mas se continuarmos no mesmo caminho podemos olhar para o futuro com otimismo”.
Na qualidade de fundador e acionista da INSUD, conglomerado empresarial voltado para indústrias farmacêutica, agroflorestal, cultural e de natureza e design, Sigman também se referiu às perspectivas sanitárias, já que é o responsável pelo laboratório que produzirá o princípio ativo da vacina contra Covid-19 desenvolvida pela Universidade de Oxford e a empresa AstraZeneca para toda a América Latina, exceto Brasil.
“Nossa região vai começar a vacinação em massa no final de março ou início de abril e a expectativa é que até meados do próximo ano já haja um grande número de pessoas vacinadas e que a vida volte a ser como era antes desta terrível pandemia. Precisamos nos dar as mãos e nos abraçar”, disse Sigman, ressaltando a extraordinária cooperação que vem ocorrendo no setor científico mundial para enfrentar a crise.
Nesse sentido, Sigman lembrou que “o acordo entre a Universidade de Oxford e a empresa AstraZeneca estabeleceu que, enquanto durar a pandemia, a empresa venderá a vacina sem obter nenhum benefício. Em minha experiência de mais de 40 anos na indústria farmacêutica, nunca vi um fato semelhante. É uma decisão única e histórica”.
Assim, “esta vacina vai ser vendida em todo o mundo entre 3 e 4 dólares, dependendo dos custos de cada país. Se compararmos com o resto das vacinas, a diferença de preço é enorme. E é ainda maior se for considerado que no próximo ano serão aplicadas entre 7 e 10 bilhões de vacinas no mundo”, resumiu o empresário.
Sigman considerou também que numa situação de emergência como a vivida na região e no mundo, são necessárias políticas públicas que favoreçam o equilíbrio entre a rentabilidade necessária de quem produz os alimentos e os preços que os consumidores podem pagar.
“Não creio – disse ele – que a liberdade total de comércio de alimentos seja possível em situações extremas. A grande demanda da China por produtos agrícolas e carnes aumentou os preços no ano passado, por isso é imprescindível a intervenção dos governos para assegurar algo tão essencial quanto a produção e o acesso aos alimentos.”
O Conselho Consultivo para a Segurança Alimentar das Américas do IICA é integrado por Silvia Sarapura (Canadá), Gloria Abraham (Costa Rica); Chelston Brathwaite (Barbados); Carlos Gustavo Cano (Colômbia); José María Sumpsi (Espanha), Cassio Luiselli (México); Elsa Murano (Estados Unidos); Martín Piñeiro (Argentina); Álvaro Ramos (Uruguai); Roberto Rodrigues (Brasil) e Eduardo Trigo (Argentina).
Enquanto isso, os Embaixadores da Boa Vontade do IICA são a empresária argentina Susana Balbo, a Senadora mexicana Beatriz Paredes, o cientista Rattan Lal, co-ganhador do Prêmio Nobel da Paz e Prêmio Mundial de Alimentação 2020; o Prêmio Nobel de Economia Michael Kremer; Hugo Sigman; o ex-Ministro da Agricultura do Brasil, Alysson Paolinelli; o Presidente Executivo da Federação Nacional dos Produtores de Dendê (Fedepalma) da Colômbia, Jens Mesa; e o CEO da Garden Pool, Dennis McClung.
Transferir conhecimento e tecnologias para pequenos produtores
O professor Lal, que há poucos dias lançou a iniciativa “Solos Vivos das Américas” junto com o IICA, destacou que a pandemia evidenciou a necessidade de fortalecer os sistemas locais de produção agroalimentar devido às dificuldades de comercialização e abastecimento de alimentos. Nesse sentido, também ressaltou que é hora de focar na transferência de conhecimentos e tecnologias aos pequenos produtores das Américas – que são mais de 80% dos agricultores do nosso continente -, com a prioridade de que seus alimentos sejam cada vez mais nutritivos e contenham as proteínas e minerais necessários para uma vida saudável.
As enormes transformações tecnológicas que estão ocorrendo na ruralidade foram um tema central no debate. O cenário atual gera a necessidade de políticas que facilitem a inclusão na digitalização de agricultores familiares e empresas cooperativas, que competem nos mesmos mercados que o restante das empresas agroalimentares.
Silvia Sarapura, acadêmica de sistemas agroalimentares da Universidade de Guelph (Canadá) questionou sobre o papel presente e futuro dos agricultores familiares e espaços de inovação local, em meio às grandes mudanças tecnológicas que estão ocorrendo na atividade agropecuária.
Sigman respondeu que, com base em sua experiência, as mudanças deveriam ser feitas progressivamente. “As novas tecnologias devem ser combinadas com as tradições produtivas e culturais desenvolvidas ao longo de muitas gerações em cada área rural. Há que ir aos poucos; as mudanças não podem ser impostas de maneira brusca”.
Para Álvaro Ramos, ex-Ministro da Pecuária, Agricultura e Pesca do Uruguai, a maior cobertura e conectividade que existe hoje nos territórios rurais da América Latina e do Caribe abre uma perspectiva interessante.
“É um assunto que discutimos há 30 anos na região, mas temos a maior oportunidade de transferência de tecnologia hoje, já que a digitalização pode chegar de forma mais eficiente e barata do que nunca aos pequenos produtores”, afirmou.
As mudanças culturais decorrentes da introdução das novas tecnologias de informação e a comunicação também foram objeto de discussão.
Dennis McClung alertou sobre a necessidade de ambos os setores público e privado apoiarem os líderes locais que estão tomando a iniciativa nos diferentes países, já que se tratam dos aliados mais credíveis e confiáveis que existem para transmitir a necessidade de modernização nas práticas agrícolas.
Os agricultores familiares são os atores fundamentais da produção agroalimentar das Américas e devem ser empoderados. “Eles devem ser ajudados a resolver as dificuldades que enfrentam, facilitando-lhes a posse da terra e o acesso à tecnologia e ao crédito, mas não deveriam ser tratados como se não soubessem produzir, porque sabem muito bem. Estamos convencidos de que os agricultores familiares são parte da solução e não do problema”, concluiu o Diretor-Geral do IICA, Manuel Otero.
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