No Conselho das Américas, peritos pedem que os agricultores sejam priorizados no debate sobre o futuro dos sistemas alimentares
Washington, 9 de abril de 2021 (IICA) – Bem-estar, produtividade, rentabilidade e sustentabilidade dos agricultores devem estar no topo das prioridades de qualquer estratégia para se pensar o futuro dos sistemas agroalimentares, que passam por um processo de transformação aguda devido às mudanças científicas e tecnológicas.
Este foi um dos consensos alcançados no painel de peritos convocados para um seminário organizado pelo Conselho das Américas e pelo Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura (IICA) com o título de “Agricultura, comunidades rurais e sistemas alimentares nas Américas: Para um enfoque integral”.
A discussão, que teve contribuições dos setores público e privado, tratou do futuro da atividade agropecuária no cenário pós-pandemia da Covid-19 e da imprescindível participação do setor agrícola no enfrentamento da mudança do clima e no reforço à segurança alimentar global, na qual o continente americano desempenha um papel vital.
Susan Segal, Presidente e Diretora Executiva da The Americas Society/Conselho das Américas (AS/COA) teve a responsabilidade de abrir o evento. Ela destacou a importância da reflexão e do intercâmbio de ideias e conhecimentos para o futuro dos sistemas alimentares em um continente que detém um quarto das terras agrícolas do mundo.
Os expositores foram Saboto Caesar, Ministro da Agricultura de São Vicente e Granadinas; Krysta Harden, Diretora Executiva e Presidente do Conselho de Exportadores de Lacticínios dos Estados Unidos; Manuel Bravo, Presidente e Diretor Executivo da Bayer México; Michael Kremer, professor de Economia na Universidade de Chicago e Nobel de Economia; e Manuel Otero, Diretor Geral do IICA. O Diretor Sênior do Escritório da AS/COA em Washington, Steven Liston, moderou a conversa.
Entre os assistentes estava Rattan Lal, Prêmio Mundial da Alimentação 2020 e professor da Universidade Estatal de Ohio, que é considerado a maior autoridade mundial em ciências do solo.
Na sua apresentação, Otero destacou que América Latina e o Caribe é a região mais importante do mundo em termos de participação nos mercados mundiais de alimentos, representando 14% das exportações totais. “No meio de uma crise tão profunda, destaco que continuamos fornecendo alimentos para 1 bilhão de pessoas que vivem nas Américas. E que, enquanto as exportações totais da região caíram 9% em 2020, as agroalimentares cresceram 2%. É disso que trata a resiliência. Ficou demonstrado que o setor agrícola nas Américas é resiliente”, disse Otero. Ele pediu que “os agricultores sejam colocados em primeiro lugar” nas discussões sobre o futuro dos sistemas agroalimentares, lembrando que a ciência deve ser a principal contribuição das políticas públicas para o setor.
O Diretor Geral do IICA acha que nada será igual após a pandemia e que o Hemisfério pode protagonizar uma nova Agricultura 4.0, que deverá produzir alimentos saudáveis de maneira climaticamente inteligente e, ao mesmo tempo, ser socialmente responsável e obrigado a prestar atendimento às demandas dos mercados internacionais.
“É preciso aumentar a produtividade”, sustentou, “e também a qualidade. Não podemos pensar mais em uma agricultura extrativa. Temos que ser harmoniosos com o ambiente”, ressaltou.
Saboto Caesar observou que a agricultura dos países da América Latina e do Caribe poderia ser ainda mais competitiva nos mercados internacionais se resolvesse os seus problemas de acesso ao capital e conseguisse baixar os seus custos de produção por meio de ferramentas científicas e tecnológicas.
Neste sentido, o Ministro da Agricultura de São Vicente e Granadinas considerou que são necessárias uma integração política mais estreita entre as nações da região e maior institucionalidade. “Enquanto não reunirmos essas condições, não poderemos atrair mais capital para o setor agrícola, condição que nos permitirá aumentar a produtividade e a qualidade dos alimentos”, afirmou.
Saboto Caesar lembrou “o passado colonial” comum aos países da América Latina e do Caribe, que os colocou “na posição de fornecedores de matérias-primas”, e convocou a região a trabalhar em conjunto para uma maior competitividade. “A integração precisa servir também para a geração de políticas conjuntas de adaptação à mudança do clima”, disse o ministro caribenho.
“Se os pequenos produtores forem bem-sucedidos, todos o seremos igualmente”, disse, por sua vez, Manuel Bravo. Para o Presidente da Bayer no México e Diretor da Divisão de Ciência Agrícola da companhia na região norte da América Latina, na agricultura do mundo pós-pandêmico “será imprescindível que os agricultores familiares possam melhorar a sua qualidade de vida e a das suas comunidades”. Neste sentido, falou da íntima relação entre a forma como se desenvolve a atividade agrícola e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentáveis (ODS) fixados pelas Nações Unidas.
“Devemos fazer mudanças”, disse Bravo, “que vão desde o acesso às melhores ferramentas de financiamento e à comercialização até a utilização de quantidade menor de água e melhorias na proteção das colheitas e do rendimento dos cultivos. A nossa companhia trabalha para ser climaticamente neutra”.
“A chave de todas essas mudanças que nos permitirão alimentar a crescente população mundial é a geração de maior valor para os agricultores, com a utilização da ciência e da tecnologia. Só conseguiremos isso com colaboração e parcerias, que incluam o setor público e o setor privado. Precisamos dos pontos de vista e da ajuda de todos”, acrescentou.
Na mesma linha, Krysta Harden ressaltou o valor da ciência e da tecnologia para o futuro da agricultura, mas também a importância de “que a voz dos agricultores seja ouvida”. A representante dos exportadores de lacticínios dos Estados Unidos observou que a indústria deve ter como prioridade o bem-estar dos habitantes das zonas rurais.
“Devemos ajudar os agricultores”, enfatizou, “a ganhar a oportunidade de alimentar as suas famílias e obter rentabilidade, para ficarem no campo. Eles são os únicos que nos podem garantir a produção de alimentos nutritivos”.
“Os agricultores querem ter as últimas tecnologias e estão desejosos de usá-las para transformar a sua atividade. Na indústria dos lacticínios, vemos inclusive que muitos dos produtores menores utilizam drones no seu trabalho cotidiano. Existem conceitos, como o de edição genética, com os quais todos temos de começar a nos familiarizarmos. Mas o que os agricultores querem sobretudo é transparência e responsabilização da parte de todos os atores envolvidos na indústria e na comercialização dos alimentos. Isso é central para que os mais jovens permaneçam nas áreas rurais e evitemos a migração”, disse a Diretora Executiva e Presidente do Conselho de Exportadores de Lacticínios dos Estados Unidos.
Michael Kremer, também Embaixador da Boa Vontade do IICA, referiu-se à importância de que os pequenos agricultores acedam às novas tecnologias da informação e da comunicação, para melhorar a situação econômica e social nas zonas rurais.
Kremer afirmou que as ferramentas digitais oferecem oportunidades de inovação que são vitais para a melhoria da produtividade. “Uma previsão precisa do tempo pelo telefone inteligente pode ser fundamental para um agricultor tomar a decisão correta de quando plantar. Uma penetração maior dos telefones serviria para melhorar significativamente as capacidades”.
“É fundamental não apenas levar tecnologia às áreas rurais, mas também trabalhar para aumentar as habilidades digitais dos agricultores, para que adotem práticas que melhorem as colheitas e as mantenham ao longo do tempo. O IICA já presta assistência a camponeses do Brasil e da Colômbia com soluções de tecnologia digital que lhes permitirão aumentar a sua produtividade e melhorar as suas condições de vida”, observou o Nobel de Economia 2019.
A The Americas Society constitui um foro de excelência para os debates políticos, sociais e econômicos contemporâneos que permeiam a região, enquanto o Conselho das Américas é um importante foro empresarial dos Estados Unidos que reúne investidores, altos funcionários e acadêmicos, sendo considerado um espaço importante para a defesa da democracia, do livre comércio e dos mercados abertos nas Américas como motores do desenvolvimento.
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