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O arroz mais austral do mundo se adapta à mudança do clima

SRI
O sul do Chile avança para uma produção de arroz sustentável e climaticamente inteligente, que economiza 80% de sementes, não utiliza herbicidas e usa 50% menos água.

Parral, Chile, 27 de abril de 2021 (IICA) — David Castillo e Washington Hernández são produtores de arroz de Parral, na região do Maule, localizada a 350 km ao sul de Santiago do Chile. Estão há mais de 20 anos produzindo na forma tradicional de inundação, que é como normalmente se associa um arrozal, debaixo de água.

Esse tipo de cultivo é o de maior rastro hídrico do mundo, demandando 1.700 litros de água para produzir meio quilo de arroz, algo insustentável em um cenário de escassez hídrica e mudança do clima.

A região do Maule está no limite da megasseca que avança há 12 anos e se transformou em um tema crítico para muitos produtores. David e Washington sabem que devem começar a se adaptar e adotar novas tecnologias para continuar produzindo.

Karla Cordero, pesquisadora encarregada do Programa de Melhoria Genética de Arroz do Instituto de Pesquisas Agropecuárias (INIA) do Chile, também é chamada de “The Queen of Rice” (a Rainha do Arroz) e tem liderado a implementação e a adoção do Sistema Intensivo de Cultivo de Arroz SRI (sigla em inglês para System of Rice Intensificaction) no país, que se apresenta como uma solução concreta aos produtores da zona e basicamente permite plantar a seco e de forma intensificada.

Cordero conta que atualmente mais de 10 milhões de produtores se beneficiam dessa metodologia em 54 países. Originário da África, o SRI foi utilizado na América com experiências bem-sucedidas em nações de clima quente, e o desafio foi adaptá-lo a um clima temperado como o chileno.

“As condições climáticas preponderantes na zona arrozeira nacional só permitem o cultivo de arroz tipo japonês, transformando o Chile no produtor do arroz mais austral do mundo. Esse clima frio estimula o crescimento do arroz livre de pragas e doenças, uma vez que elas não prosperam em ambientes de baixas temperaturas, de modo que o cultivo se desenvolve com baixa carga química, livre de pesticidas e fungicidas. Essa característica nos diferencia do resto do arroz cultivado no mundo, que apresenta múltiplas aplicações de pesticidas para que se possa obter um nível produtivo rentável”, indicou.

A pesquisadora está há mais de 4 anos trabalhando para gerar dados e informações relevantes e valiosas para o desenvolvimento desse sistema no Chile e em outros países de clima temperado.

A aplicação dessa metodologia foi reconhecida pela prestigiosa Universidade de Cornell, nos Estados Unidos, que publicou em seu portal de Recursos e Rede Internacional SRI: “O SRI é parte de uma reorientação para a produção sustentável, uma vez que permitirá avançar na redução de produtos químicos utilizados no cultivo, eliminando o uso de herbicidas e, ao mesmo tempo, economizando uma importante quantidade da água que atualmente é utilizada para o arroz”.

Há vários anos que o Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura (IICA) trabalha com países como a Nicarágua, a Costa Rica, a República Dominicana, a Venezuela e a Colômbia na promoção, adaptação e validação da metodologia SRI como um caminho possível para um setor de arroz mais produtivo, competitivo, resiliente e de baixas emissões.

No Chile, a produção promove quatro princípios básicos: o cultivo precoce (flexibilidade na data de plantio); a redução da competição entre plantas, pelo controle mecânico de ervas daninhas; a manutenção de solos saudáveis (aeração e oxigenação das raízes); e a alternância de solos secos e úmidos.

Trata-se de princípios que, juntamente com uma semente com características de alto rendimento, melhor qualidade industrial, precocidade e adaptação aos novos cenários de déficit hídrico, constituíram um arroz climaticamente inteligente que, depois de dois anos de testes e estudos experimentais, já está disponível para ser massificada entre os produtores.

Fernando Barrera, especialista em Extensão Rural do IICA, disse que o desafio nessa etapa do projeto é dar continuidade a um processo de pesquisa participativa com agricultores, extensionistas, pesquisadores e agentes de desenvolvimento.

“Vamos trabalhar para determinar a estratégia de irrigação em escala agrícola que permita alcançar, de maneira eficiente, uma redução de 50% no consumo de água, o que já alcançamos no nível experimental, ajustando o sistema de plantio a seco para obter um uso mais eficiente das sementes e ter plantas mais vigorosas, resilientes e que permitam estabelecer populações que assegurem altos rendimentos”, indicou.

Barrera acrescentou que “avançaremos em um sistema de controle de ervas daninhas mecanizado que reduza a dependência de herbicidas e que contribua com soluções mais amigáveis ao meio ambiente, e identificaremos as linhas genéticas que melhor se adaptem ao SRI para acompanhar todas as mudanças na gestão produtiva com as plantas mais bem adaptadas ao estresse hídrico. A ideia também é trabalhar em estratégias comerciais que capturem o valor de uma produção mais sustentável e que representa o melhor do nosso mundo rural”.

Segundo o especialista do IICA, depois da fase experimental, virá uma etapa na qual essa tecnologia será transferida para os agricultores, processo de extensão que contemplará ferramentas e conhecimentos elaborados especialmente para os produtores com o objetivo de gerar impacto e adesão a essa nova forma mais sustentável de produzir.

Projeto regional, inovação e ciência aplicada à adaptação à mudança do clima

A iniciativa é financiada pelo Fundo de Inovação para a Competitividade (FIC), do governo regional do Maule, e promove a pesquisa, a inovação e a competitividade no setor. Pretende beneficiar cerca de 1.100 agricultores de arroz, assim como a cadeia associada ao artigo, que inclui assessores técnicos dos produtores, empresas, organismos públicos chilenos, como ODEPA e INDAP, e indiretamente a todos os consumidores de arroz nacional.

Rodrigo Avilés, Diretor Regional do INIA Quilamapu/Raihuén, indicou que a zona de Parral apresenta a maior produção de arroz do Chile, em torno de 60%. “Devido ao que temos vivido nos últimos anos, pela restrição hídrica e de precipitações, com o programa de melhoria genética de arroz do INIA nessa busca para ajudar os agricultores a se adaptar ao novo cenário agrícola, caracterizado pela mudança do clima, a escassez de água para irrigação e maiores exigências ambientais por parte dos mercados, chegamos a essa alternativa que estamos mostrando nessa propriedade experimental em Digua junto ao IICA”.

David e Washington foram convidados pelas equipes do INIA e do IICA para ver, com seus próprios olhos, os avanços nesse sistema de cultivo a poucos quilômetros de seus campos, um laboratório ao ar livre onde os pesquisadores do projeto testam sistemas de irrigação, sementes e gestão agronômica.

Ambos produtores da zona de Cuyumillaco, eles conhecem melhor do que ninguém o problema da escassez de água, e cultivam cerca de 100 hectares que vendem diretamente para as fábricas.

Após conhecer a metodologia, ambos se comprometeram a implementá-la e destinarão um hectare de suas terras para continuar queimando etapas para uma migração gradual na forma de produzir, agora com um arroz climaticamente inteligente e preparado para se adaptar à mudança do clima.

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