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Primeira coordenadora nacional de juventude rural representa o Brasil no Fórum de Jovens Rurais da América Latina realizado pelo IICA no Chile

País de publicación
Brasil
Capa 1º Fórum LATAM de Jovens Rurais

 

Brasília 17/09/2024 - Os novos desafios dos jovens do campo no século XXI estão cada vez mais complexos em um cenário que busca conciliar o desenvolvimento agropecuário, a segurança alimentar, as preocupações ambientais e a transição energética. Para contribuir na formação de novas lideranças, jovens do Chile, Argentina, Brasil, El Salvador, México, Honduras, Paraguai e Uruguai participaram, na última semana, do I Fórum de Jovens Rurais da América Latina - Liderança, Inovação e Sustentabilidade, realizado pelo Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura (IICA) Chile, na sede da CEPAL, em Santiago.   

No evento, os participantes entraram em contato com experiências e ferramentas que tornem os sistemas produtivos mais sustentáveis ​​e inovadores e colaborem com a transformação dos representantes desses países em líderes do Cone Sul. Foram palestras, compartilhamento de experiências e visita a uma propriedade rural que utiliza tecnologia nos trabalhos diários e na gestão do empreendimento.  

O fórum foi organizado pelo Ministério da Agricultura do Chile, em colaboração com a Fundação para a Inovação Agrária (FIA), o Instituto de Desenvolvimento Agropecuário (INDAP), o Global Youth Leadership Forum (GYLF), a Sociedade Nacional de Agricultura (SNA), AgroTech Chile e o Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura (IICA).    

À convite do IICA Brasil, os jovens brasileiros foram representados pela paraibana Maria Eduarda Vasconcelos que, aos 25 anos, é a primeira coordenadora-geral da Juventude Rural do Ministério de Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA) e representante do MDA na Comissão de Agricultura do Mercosul durante a presidência temporária do Brasil.  “Esse intercâmbio com países latino-americanos é muito importante principalmente no processo de retomada de políticas públicas no Brasil e interlocução com outros países. Nosso país pela dimensão e tradição centraliza a esperança da América Latina para públicos específicos na agricultura, mas temos que conhecer outras experiências. Essa bagagem vai ser importante para dar visibilidade ao tema e colaborar com os jovens que querem ficar no campo. Quero levar esse acúmulo de conhecimento e as novas conexões para base para criar esse espaço, pois como participantes do primeiro Fórum somos pioneiros”.  

O representante do IICA no Chile, Hernán Chiriboga, ressaltou a necessidade de atrair as novas gerações para o setor agrícola: “Precisamos de uma renovação geracional no campo do Chile e das Américas. Temos que tornar o setor agropecuário mais atraente para a juventude, com propostas inovadoras como a agricultura 4.0. Este fórum é fundamental para fortalecer a liderança dos jovens rurais. Estamos felizes em estar aqui com mais de 60 jovens chilenos e a participação de oito países da América Latina. Trabalhamos em equipe, aprendendo com boas práticas que fortalecerão o setor agropecuário tanto no Chile quanto na região. Queremos que os jovens vejam no setor rural um futuro promissor.”, explicou 

Ao final do encontro, os jovens colaboraram na construção de um plano de trabalho sobre o tema a fim de dar continuidade às iniciativas e sugestões compartilhadas. Para Jacobo Pombo, presidente do Global Youth Leadership Forum (GYLF), é importante a colaboração entre jovens e governos para enfrentar esses desafios. “Este fórum foi uma experiência profundamente inspiradora. Trabalhar com governos e organismos multilaterais para analisar os desafios do mundo rural e reduzir a lacuna de desigualdade é fundamental para a governança de nossos países. Graças ao plano de trabalho e ao prestígio das instituições envolvidas, obteremos resultados tangíveis que beneficiarão o mundo rural”, concluiu. 

Exposições e Atividades 

Durante os dois dias do fórum, os participantes assistiram a conferências e oficinas sobre as novas tendências do setor agropecuário, como o uso de tecnologias avançadas — inteligência artificial, blockchain e automação — e o papel crucial dos jovens na modernização deste setor. 

O primeiro dia incluiu apresentações de especialistas como Hernán Chiriboga e Santiago Rojas, diretor do INDAP, que falou sobre as estratégias de apoio para os jovens rurais. Os participantes também participaram de mesas de discussão centradas no financiamento alternativo para agricultores não bancarizados e o papel da inovação. 

No segundo dia, os jovens visitaram a Quinta Tilcoco, na região de O'Higgins, onde conheceram o projeto Farmhability, liderado por Alfredo Carrasco, um sistema produtivo adaptado para pessoas com deficiências que promove a inclusão no setor agrícola. Carrasco, premiado com o reconhecimento "Alma da Ruralidade 2021", compartilhou seu orgulho pelo avanço do projeto: "Ver a possibilidade de que jovens de diferentes nações estejam aqui no Farmhability é motivo de orgulho. O esforço de instituições como ICA, INDAP e FIA é fundamental para continuarmos avançando." 

A jornada terminou com a apresentação de Stanley Best, do INIA Los Tilos, em Buin, setor rural da Região Metropolitana, que compartilhou sua visão sobre a otimização dos campos agrícolas por meio de tecnologias inteligentes, sublinhando o papel da inovação no futuro do setor. Ao final do evento, os jovens líderes receberam certificados que destacam o valor da cooperação internacional e a importância da inovação para transformar o setor rural na América Latina.  

Com informações do IICA Chile 

Conheça a história da representante do Brasil no Fórum de Jovens Rurais da América Latina 

Quem conversa com Duda, como é conhecida, imediatamente se encanta com sua inteligência, conhecimento, maturidade, capacidade de articulação e percebe sua habilidade natural para liderança, características que, muitas vezes, só aparecem com o avançar da idade. Outra qualidade que chama atenção é a gana de fazer a diferença, criando e executando políticas públicas que podem contribuir para o bem-estar do jovem no campo.  Alinhada com as novas demandas, ela utiliza o termo “juventude do campo, das águas e da floresta” para mostrar a diversidade da juventude rural. 

Natural de Barra de São Miguel, município com 6 mil habitantes a 200 km da capital João Pessoa, a filha de trabalhadores rurais morou em 15 fazendas devido ao ofício dos pais até conseguir uma propriedade no assentamento Bom Jesus em 2014.  

No assentamento, ela já participava de atividades da Pastoral da Juventude Rural, movimento progressista ligado à igreja, quando foi selecionada como bolsista Jovens Tecendo Futuro, ação do Projeto de Desenvolvimento Sustentável do Cariri, Seridó e Curimataú (Procase/PB), iniciativa do IICA, do Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola (FIDA) e governo da Paraíba.  

A iniciativa prepara jovens da comunidade para promoção da ruralidade e extensão rural com o objetivo de contribuir para o desenvolvimento rural sustentável do semiárido paraibano, reduzindo os atuais níveis de pobreza rural e fortalecendo as ações de prevenção e mitigação da desertificação em sua área de intervenção.  

Um dos resultados do grupo de jovens bolsistas foi a criação de um banco de sementes nativas da região. “Fazíamos visitas aos assentados, entendíamos o que precisavam para produção no campo e mostrávamos uma perspectiva de futuro junto com à associação rural. Foi muito interessante porque levamos muito a sério sem perder a animação. Além do trabalho de campo e de mobilização, a gente organizava quadrilha e uma festa que ficou famosa para mantermos e resgatarmos a identidade rural”, explicou Maria Eduarda.  

Neste contexto, ela começou seu percurso como militante na causa rural e desenvolveu predileção pela articulação política e suas possibilidades de proporcionar mudanças efetivas na sociedade. No tempo livre, Duda gosta de "socializar”, curtir um samba ou um forró, ver séries, documentários e viajar. Com tanta paixão e entusiasmo pelo que faz, outro hobby é estudar e respirar política.  “Desde pequena acompanhava o processo eleitoral, tinha todos os adesivos”, revelou.  

Estudante de Ciências Sociais, ela teve de interromper os estudos durante a pandemia por dificuldades de acesso à internet. Morando na capital do país desde 2023, se tornou aluna da Universidade de Brasília (UnB).  

Os pais continuam morando no assentamento onde cultivam milho, feijão e jerimum e criam ovelha, cabra e galinha. “A vida melhorou, conseguimos financiamento do Pronaf, mas os desafios continuam, principalmente relacionado ao clima. A gente planta quando chove, uma vez por ano. São colheitas curtas”. 

Mesmo quando ela fala sobre as dificuldades e os avanços morosos na formulação e execução de políticas voltadas para a juventude no campo, Maria Eduarda demonstra uma mistura de bom humor e leveza com a força e a determinação que a missão exige.  

Para a coordenadora-geral de Juventude Rural do MDA, o maior desafio é o processo sucessório no campo. Segundo dados da Pesquisa Nacional de Amostra por Domicílio (PNAD) do IBGE houve uma redução no Brasil do número de jovens entre 16 e 32 anos no campo de 8 milhões (2010) para 6,7 milhões em 2020. 

“É uma realidade muito dura porque os jovens saem do campo em busca de oportunidade e acesso a condições melhores de vida, mas acabam sendo explorados em trabalhos precários, vivem nas periferias, sofrem com a violência e, infelizmente, acabam virando uma estatística negativa”, explicou Vasconcelos.  

Além de ser um trabalho pesado físico e mental, de acordo com Duda, a juventude larga as atividades agrárias porque não consegue ter perspectiva de vida em lugares sem acesso à educação, tecnologia, internet, saúde, lazer e cultura.  

“É na juventude que formamos nossa identidade e buscamos a mesma qualidade de vida e experiência do jovem da cidade, mas só tem acesso a isso quem tem dinheiro na cidade. O povo não tem casa, não tem crédito para investir. Assim o campo não é saída, ele não enxerga como futuro. Eu só consegui entrar na militância porque meus pais já tinham casa e terra, condições mínimas de viver no campo. O Brasil é muito desigual como o país agrário. E a cultura da meritocracia não ajuda porque achamos que a falha é nossa e não das condições desiguais. Estamos vivendo numa sociedade em que pressão social para dar certo é grande”, destacou.  

Outro fator para dificultar a sucessão rural é o machismo. “O campo está muito envelhecido e masculinizado. As mulheres saem do campo por causa do machismo. A sucessão nunca é para mulher que não tem renda, nem autonomia. Acham que só casar é a solução. A tristeza é saber que só tem essa perspectiva. É enraizado na cultura.” disse. 

Ela confessa que foi uma surpresa ter sido convidada para exercer a função de coordenadora no MDA. “Nunca imaginei. Sempre estudei, militei, fui bolsista de projetos, mas era tudo pequeno. Na entrevista, eu disse que podia começar no dia seguinte, mas achei que não iria durar uma semana. Meus pais falam para todo mundo que trabalho em Brasília.”, lembrou Vasconcelos.   

Os pais de Duda ainda vão ter muito orgulho da filha pois as próximas conquistas já estão a caminho: lançamento do Plano Nacional de Juventude, construído em conjunto com 14 ministérios, do Plano Nacional de Sucessão Rural do MDA e os trabalhos no Y20, instância do G20 sob a presidência do Brasil que trata das questões da juventude.